Como resgatar o seu imposto de ICMS indevidamente pago na conta de energia elétrica?

08/03/2017 16:06

REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO

Repetição de indébito tributário refere-se à possibilidade do direito do contribuinte pleitear, junto às autoridades fazendárias, a devolução de tributo pago indevidamente ou nas demais hipóteses listadas pela Lei.

PAGAMENTO INDEVIDO DE TRIBUTOS

Nos termos do artigo 165 do CTN, os contribuintes têm o direito de, independentemente de prévio protesto, solicitar, junto ao ente tributante, a restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade do seu pagamento, nos seguintes casos:

—    cobrança ou pagamento espontâneo de tributo indevido ou maior que o devido em face da legislação tributária aplicável, ou da natureza ou circunstâncias materiais do fato gerador efetivamente ocorrido;

—    erro na identificação do sujeito passivo, na determinação da alíquota aplicável, no cálculo do montante do débito ou na elaboração ou conferência de qualquer documento relativo ao pagamento;

—    reforma, anulação, revogação ou rescisão de decisão condenatória, seja esta administrativa ou judicial.

RESTITUIÇÃO DE INDÉBITO

A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la (artigo 166 do CTN).

É o caso, por exemplo, do IPI apurado e cobrado nas vendas e destacado em notas fiscais. Este valor acrescido ao valor da mercadoria, é faturado e cobrado do comprador. Portanto, compete a este, e não ao vendedor, a eventual restituição.

A restituição total ou parcial do tributo dá lugar à restituição, na mesma proporção, dos juros de mora e das penalidades pecuniárias, salvo as referentes a infrações de caráter formal não prejudicadas pela causa da restituição (artigo 167 do CTN).

A restituição vence juros não capitalizáveis, a partir do trânsito em julgado da decisão definitiva que a determinar.

Ressalve-se que o direito de pleitear a restituição extingue-se com o decurso do prazo de 5 anos e que a ação anulatória da decisão administrativa que denegar a restituição prescreve em 2 anos (artigos 168 e 169 do CTN).

Os valores dos indébitos tributários podem ser restituídos sob duas formas:

1. por devolução, quando o Estado a faz em espécie; ou

2. por compensação, quando o Estado permite que o sujeito passivo a aproveite para abater, de imediato ou em recolhimentos futuros, algum débito, em geral, da mesma natureza.

ICMS e repetição de indébito: legitimidade “ad causam” do consumidor final de energia elétrica – STJ / REsp 797826

 

Diante do atual entendimento do STJ,o consumidor final de energia elétrica que denotar erro no recolhimento ante a incidência do Imposto sobre o valor do contrato, poderá pleitear restituição do percentual incidente sobre a potência não utilizada.

 

A sistemática tributária nacional fez aparecer em algumas situações a figura doutrinariamente chamada de “Contribuinte de Direito” que transfere para outrem, “Contribuinte de Fato”, o valor recolhido a título de tributação indireta em uma relação de cascata ou cadeia tributária. Desta forma, nem sempre o contribuinte que assim é definido por lei para pagar o tributo é, efetivamente, quem suporta em definitivo a carga tributária.

 O ICMS, por exemplo, é um imposto indireto, uma vez que o consumidor final é que, de fato, acaba por suportar a carga tributária, embora não seja designado pela lei como contribuinte desse imposto.

Em regra, quando um sujeito passivo paga a maior um tributo direto, fácil fica encontrarmos o sujeito ativo da Ação de repetição de indébito fiscal, pois ele é bem destacado legal e faticamente, tendo uma relação próxima e direta com o recolhimento feito.

Entretanto, diante dessa relação em cadeia de recolhimento e repasse de ônus dos impostos indiretos, a situação começou a ficar mais inquietante, mas invariavelmente ocorrente, diante da previsão legal do artigo 166 do CTN e entendimento dado pelo STJ no julgamento de Recurso Repetitivo 903.394 que faculta apenas ao Contribuinte de Direito a possibilidade de repetição dos valores erroneamente pagos a título de ICMS, ainda que os valores tenham sidos repassados no preço da mercadoria ao consumidor final. Em outras palavras, o consumidor final que pagou o preço com ICMS embutido, seria o que a doutrina chama de contribuinte de fato, ou seja, “aquele que faticamente suportou o encargo”, não teria legitimidade de propor a demanda de Repetição de indébito fiscal diante de um errôneo recolhimento em fases anteriores da cadeia, uma vez que o fato gerador da obrigação tributária foi realizado pelo(s) Contribuinte(s) de Direito.

Entretanto, quando tratamos da incidência de ICMS sobre energia elétrica a situação em questão torna-se peculiar em razão do entendimento dado também pelo STJ. Nos termos da Súmula 391, o fato gerador do imposto se dá quando da efetiva utilização da potencia elétrica disponibilizada, não quando da assinatura do contrato de disponibilização da energia.

Desta forma, contrariando tudo o que até então vinha sido julgado em relação ao tema, nessa específica situação, reconheceu o Superior Tribunal de Justiça, a legitimidade da proposição da “Ação Declaratória de Inexistência de relação jurídico - tributária cumulada com Repetição de Indébito” pelo Contribuinte de Fato.

PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. ICMS. ENERGIA ELÉTRICA. LEGITIMIDADE ATIVA. CONSUMIDOR FINAL. DEMANDA RESERVADA DE POTÊNCIA. FATO GERADOR.

1. O sujeito passivo da obrigação tributária é o consumidor final da energia elétrica, que assume a condição de contribuinte de fato e de direito, figurando a concessionária como mera responsável pelo recolhimento do tributo. (...)

2. É cediço em sede doutrinária que, verbis: "Embora as operações de consumo de energia elétrica tenham sido equiparadas a operações mercantis, elas se revestem de algumas especificidades, que não podem ser ignoradas. O consumo de energia elétrica pressupõe, logicamente, sua produção (pelas usinas e hidrelétricas) e sua distribuição (por empresas concessionárias ou permissionárias). De fato, só se pode consumir uma energia elétrica anteriormente produzida e distribuída. A distribuidora de energia elétrica, no entanto, não se equipara a um comerciante atacadista, que revende ao varejista ou ao consumidor final, mercadorias de seu estoque. É que a energia elétrica não configura bem suscetível de ser" estocado ", para ulterior revenda aos interessados. Em boa verdade científica, só há falar em operação jurídica relativa ao fornecimento de energia elétrica, passível de tributação por meio de ICMS, no preciso instante em que o interessado, consumindo-a, vem a transformá-la em outra espécie de bem da vida (luz, calor, frio, força, movimento ou qualquer outro tipo de utilidade). Logo, o ICMS-Energia Elétrica levará em conta todas as fases anteriores que tornaram possível o consumo de energia elétrica. Estas fases anteriores, entretanto, não são dotadas de autonomia apta a ensejar incidências isoladas, mas apenas uma, tendo por único sujeito passivo o consumidor final.
(STJ - AgRg no REsp: 797826 MT 2005/0186252-5, Relator: Ministro LUIZ FUX, Data de Julgamento: 03/05/2007, T1 - PRIMEIRA TURMA, Data de Publicação: DJ 21.06.2007 p. 283)

 

O fundamento central do acórdão, portanto,  partiu da premissa de que há aumento de impostos, automaticamente há aumento de tarifas pelas concessionárias, por disposição normativa inerente à política tarifária dos serviços públicos concedidos, ou seja, o consumidor paga tributo, e não apenas preço fixado pelo mercado, diversamente do que acontece na generalidade das situações referentes ao ICMS. Ou seja, no caso da energia elétrica, o tributo integra a tarifa e, portanto, não há como deixar de ser repassada ao consumidor final, único que terá interesse em promover ação judicial. Além disso, não há concorrência no mercado de fornecimento de energia, sujeitando-se o consumidor ao repasse na tarifa. Nesse sentido, o consumidor de energia é o legitimado ativo na propositura da ação, uma vez que: "a legitimidade ad causam consiste na pertinência subjetiva da ação e é identificada a partir da situação jurídica de direito material objeto da lide" (MEDINA, José Miguel Garcia. Código de Processo Civil comentado. 2. ed. ver. atul. e ampl., São Paulo: RT, 2012, p. 42).

O voto do relator entendeu ainda, que as concessionárias não têm o menor interesse em mover ação de repetição de indébito, uma vez que detêm relação contratual com o órgão público e sujeito passivo da respectiva ação.

Diante desta atual perspectiva, associada à previsão da Súmula 391 do STJ editada em 2009, o consumidor final que denotar erro no recolhimento, diante da incidência do Imposto sobre o valor do contrato, poderá propor Ação declaratória de inexistência de relação jurídico-tributária buscando o reconhecimento da não ocorrência do fato gerador do ICMS quando da contratação, requerendo cumulativamente, a restituição do percentual incidente sobre potência elétrica não efetivamente utilizada.

Fonte: Jus Navegandi